Não
há muito tempo li um livro que adorei. Babyji, exemplarmente redigido por
Abha Dawesar, escritora indiana duma capacidade de escrita muito acima da
média. É daqueles livros que nos agarram desde a primeira página até à última
(340).
Devo
dizer que quando o comprei, tinha apenas como referência uma breve, mas muito
cativante sinopse publicada na Visão, mas decorrendo a acção na
Índia, mais me “aguçou o apetite”, isto porque sou simplesmente doido por
aquele país, aquela cultura fascina-me desde longa data.
Anamika,
ou Babyji, como carinhosamente é chamada pelos que lhe são mais próximos,
vive em Nova Deli e é uma estudante excepcional, é genial a Física
Quântica, adora estudar, e procura sempre superar tudo e todos para não
desapontar ninguém, já que é olhada por seus pares como exemplo a seguir.
Mantém com a directoria da escola onde estuda uma relação muito próxima, já que
representa todos os estudantes do seu colégio. Sente-se orgulhosa disso mesmo,
é o orgulho dos seus pais, mas sente o peso que acarreta, a posição que ocupa na
sua micro – sociedade.
“Em
casa, lê o Kamasutra às escondidas e, no seu esforço para crescer,
atrai as atenções de homens e mulheres, rapazes e raparigas. Ávida de
experiências e saber, questiona a justiça e a relevância do sistema de castas indiano,
o conservadorismo do país e questões morais e intelectuais tais como a
homossexualidade e a religião.” É descrita uma adolescente que para além de
sofrer com as mudanças próprias inerentes à sua idade, é ainda perturbada por
uma inteligência e espírito crítico muito acima da média, muito além do que a
sua idade lhe deveria exigir! Os próprios amigos de Anamika não a entendem
quando os questiona sobre algo, está quase sempre para além do seu
conhecimento, mas não a criticam por isso. Admiram-na!
Babyji,
não encontrando as respostas que pretende pelos meios convencionais, procura-as
de outras formas. Será através da prática sexual que vai encontrar muitas das
soluções aos seus problemas.
Ousada,
já que o sexo é, ainda hoje, tema tabu neste país de raízes tão peculiares,
esta adolescente, em busca de si própria envolve-se em diversas relações de
amor, umas hetero, outras homossexuais, o que lhe poderia valer a qualquer
momento fortes reprimendas e mesmo castigos demasiado pesados para a sua
inocência. Desafiou toda uma moral intrínseca, duma sociedade ultra –
conservadora, uma família regida pelos velhos costumes, mas descobre sempre
aquilo a que se propõe.
Romances
com as mais cobiçadas colegas do colégio, com o detestável rufia da escola, com
a empregada da sua casa, amores escaldantes com amigas de sua mãe ou com o pai
do seu melhor amigo, Anamika, passa a encarar cada relação sua como uma
panóplia, como uma fonte de respostas à sua mente tão ávida de conhecimento adulto,
conhecimento que não considera de forma nenhuma ser precoce.
Realmente
a não perder. É adorável, entusiasmante, embora considere que por algumas vezes
a autora se tenha deixado levar pela paixão, pelo querer expor o que tanto se
preza naquele país por manter escuso ao resto do mundo: o preconceito ou em
última análise o racismo advindo única e simplesmente de forma hereditária ou
por via das tradições.
A
história em si é mesmo bastante agradável à leitura recreativa, mas o que mais
me apaixonou nesta obra foi indubitavelmente a forma como a Abha tão bem soube
caracterizar a sociedade indiana actual.
Muito
embora não tenha sido uma nova descoberta, a forma como é descrita a
estratificação da sociedade em castas é deveras adorável. O preconceito
dos Brâmane (ricos e nobres) face ao pobre e às profissões
consideradas menos relevantes, a superstição daqueles em relação aos
desfavorecidos e o nojo com que são olhados os Párias ou os
condenados aos trabalhos mais sórdidos e mal pagos, é retratada de uma forma
avassaladora, muito cuidada e extremamente elucidativa.
Abha
Dawesar consegue despir todo um país de forma sensual, e põe a nu, aos olhos do
mundo, todo o preconceito que em pleno século XXI ainda existe no seu país
natal.
Objectivo
alcançado, já que segundo a própria, foi a isso mesmo que se propôs
inicialmente.
Eu
recomendo!
Abha
Dawesar, Babyji, Edições Asa, 2007
Telmo R.
Nunes a 18/04/08
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