segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Da Mão para a Boca



Foram já diversos os livros que li escritos pelo norte-americano Paul Auster. Aqui mesmo teci alguns comentários às ditas composições e, em todas lhes reconheci grandes méritos, ora pela história narrada, ora pela estrutura externa, pela tipologia de linguagem, pelo estilo de escrita, etc; na realidade é um autor fabuloso, um dos meus predilectos.
            Segundo rezam as suas diversas biografias, Auster sobressai-se como escritor, argumentista, tradutor, ensaísta, realizador, marinheiro, inventor de um jogo de cartas entre outros ofícios. Assim, com a atenção dispersa por tantos e tão diversificados focos de interesse, como poderá este homem ser realmente bom em qualquer que seja a actividade?
            A explicação chegou-me na última composição que li sua. Em “Da Mão para Boca”, o autor (d)escreve-se de uma forma tão real, intimista e pormenorizada que, para além de nos colocar a par do seu início atribulado de carreira literária, abre-nos, também, o seu próprio mundo; narra-nos as dificuldades atravessadas até ao estrelato, as batalhas constantes contra as inúmeras adversidades; dá-nos uma verdadeira lição de vida no atinente à defesa dos ideais próprios de cada indivíduo; é-nos descrito todo um processo vivencial antagónico: a fuga à canonização da escrita em demanda da importância monetária, e a necessidade de o fazer para alimentar as necessidades corpóreas – acto que o arremessa à profunda desilusão e ao limite das suas crenças!
            Escrito numa linguagem acessível aliás, apanágio seu, “Da Mão para a Boca”, ganha também relevo pela forma como o autor descreve as adversidades causadoras de tamanhos tumultos ao longo da sua vida. É impressionante como consegue relatos descritivos absolutamente geniais acerca de situações de extrema complexidade e, acredito, causadores de enorme frustração. É certo que muitos anos passaram, e muitos sucessos advieram desde então, o que lhe permitirá um relato distanciado e até saudosista, arrisco, mas, ainda assim, conseguir expor momentos tão marcantes de uma forma tão singela, natural e até literariamente enriquecida, não está, de facto, ao alcance de qualquer um!
            A ser, na realidade, plenamente autobiográfico, como o próprio afirma, torna-se, deveras, uma composição única, um texto inteligente, “um livro soberbo. Uma lição de vida (…).”
           

01/Maio/2010

Mosteiros - São Miguel