sábado, 15 de março de 2014

in Açoriano Oriental

Queremos uma democracia formal, ou uma de substância? 
Queixam-se os Deputados eleitos à Assembleia Legislativa Regional de falta de democracia nos Açores. Usam-se termos como “divisionismo”, “amordaçar” ou “prepotência”. Eu acho que têm razão, e nos dias que correm este tipo de postura governativa não faz qualquer sentido. Ainda que o considere utópico, a pluralidade de opinião deveria ser sempre tida em conta e, da discussão, dever-se-ia chegar ao consenso. Não obstante, recorde-se, a exemplo, o episódio da votação do concurso de pessoal docente: o juízo dos intervenientes naquela assembleia foi consensual; votou-se em uníssono; não se ouviu uma voz divergente. A questão é que, das seis forças políticas com assento parlamentar, apenas duas intervieram naquela votação, ausentaram-se 25 dos 57 deputados! E não me venham com a questão do “aproveitamento político” por parte dos que se retiraram, porque a eles se junta a voz de toda uma classe profissional! A verdade é que algo está errado e, neste caso, como noutros, parece-me ser a postura legitimada, mas inflexível, da maioria socialista, a mesma que parte dos deputados acusa de revelar demasiada “prepotência”. Ironias à parte, muitos dir-me-ão que a democracia funciona assim mesmo: as pessoas votam, um partido vence o escrutínio e forma governo, os outros perdem e serão apenas parte da oposição. Embora assim seja, permitam-me divergir um pouco desta postura tão simplista e formal de viver em democracia. Numa definição breve mas universal, e na qual me revejo por ser recheada de conteúdo, explicar-se-ia o sistema democrático como sendo uma forma de governo em que todos os cidadãos participam, (seja diretamente ou por via de representantes eleitos), na proposta, no aperfeiçoamento e na criação de legislação que proteja todo o indivíduo inserido naquela sociedade. Em consequência, quando assim não acontece, e se mantém o poder circunscrito a uma pequena fração de indivíduos que não consegue responder às necessidades de um todo, dificilmente lhe chamaria democracia. Por conseguinte, a força política que maior número de votos alcança do ato eleitoral, tem a responsabilidade de formar um governo e, por altura das Legislativas de 2012, foi ao PS que os açorianos atribuíram essa responsabilidade, acrescida de uma maioria parlamentar. (Se bem que, quando 52% da população votante total não expressa a sua vontade e se abstém, muito me custa reconhecer qualquer maioria). Porém, uma vez empossados nos cargos, é recorrente o esquecimento por parte dos governantes de que os deputados posicionados do outro lado da bancada se encontram também legitimamente eleitos e mandatados pelos cidadãos, constituindo-se, por isso, a representação de milhares de pessoas e, como tal, devem também ser responsavelmente ouvidos e tidos em consideração no momento da tomada de decisões. Negligenciar esta voz, por vezes dissonante, será, a nível político, uma atitude pouco razoável e socialmente uma postura muito pouco cautelosa. Dito isto, pobre o governo, mesmo quando amparado por uma maioria parlamentar, que se julgue capaz de, sozinho, ditar o destino de toda uma sociedade, descurando a discussão, a pluralidade de opinião, ou o reconhecimento de mérito àqueles que agora ocupam o lugar destinado à oposição. Do humilde procedimento inverso, esses governantes sairiam, com toda a certeza, valorizados e engrandecidos, mas essa parece-me ser hoje uma postura muito pouco exequível... Recordando os resultados das últimas Legislativas Regionais, percebe-se que os 31 assentos que o Partido Socialista detém na Assembleia Legislativa Regional são a representação de 52827 eleitores, mas é conveniente não esquecer que, para além destes, votaram ainda outras 50166 pessoas nessas eleições, e que também elas estão à espera de ver os seus problemas resolvidos por um governo que se quer sempre de e para todos. 

Telmo R. Nunes 
a 13 de março de 2014

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