terça-feira, 19 de janeiro de 2016

in Açoriano Oriental



A pressa é inimiga da perfeição
Desde novembro último vivemos uma época triste! Interrompeu-se escandalosamente um ciclo de retomas sustentadas, para se recuperarem as políticas que conduziram ao estrangulamento do país.
Temos, desde então, um legítimo Governo Constitucional chefiado por um derrotado em escrutínio nacional; somos governados por pessoas que, ardilosamente, navegaram pelos subterfúgios da Constituição até chegarem ao poder; temos, pelas alianças trocadas, um executivo governativo sustentado mas refém daqueles que maldisse e pelos quais tantas vezes fora criticado.
Desde então, medidas avulsas foram perigosa e apressadamente aprovadas pela maioria alargada no Parlamento: umas plenamente irresponsáveis, outras carecendo de uma inexistente discussão pública.
Estranhamente, e no que se refere à Educação, aboliram-se, a 27 de novembro, as Provas Finais do 1.º Ciclo, tendo a tutela apenas publicado a 8 de janeiro seguinte o “Modelo integrado de avaliação externa das aprendizagens no Ensino Básico”, que regula essa abolição, assim como dita as novas linhas orientadoras de todo sistema de avaliação externa. Trata-se de um conjunto de medidas que representa tão-somente a destruição e a rutura (a meio do ano letivo) de todo um sistema de avaliação, paulatinamente erigido desde o ano 2000, e que, reconhecidamente, já conferia a necessária estabilidade e confiança a todos os agentes envolvidos neste processo: pais e encarregados de educação, responsáveis pelas escolas, professores e, essencialmente, aos alunos.
Era um processo sustentado que vinha gradualmente a ser aperfeiçoado e, não me custa admitir, teria de ser revisto em determinados aspetos da sua execução. Não obstante, o ímpeto fraturante dos parlamentares mais à esquerda, assim como a nova equipa ministerial tal não o entenderam e preferiram lançar a escola num mar de instabilidade e incerteza, demonstrando um tremendo desrespeito pelo sistema escolar, assim como por todos os seus agentes.
Segundo Tiago Rodrigues, o modelo anterior era “errado” e “nocivo”, impelia à “exclusão” dos alunos, assim como promovia a “cultura da nota”. Tal como para algumas parcelas da sociedade menos esclarecidas em matéria de educação, a realização destas Provas Finais – rosto visível de todo um sistema de avaliação – era um veículo que apenas servia para “chumbar” alunos, para puni-los pelo seu fraco desempenho académico.
 Claro que quem conhece bem o sistema educativo, quem o percebe e convive com ele há anos, sabe que estas são falsas questões. O próprio Conselho Nacional de Educação – CNE – acautela isso mesmo no parecer emitido a propósito da “Avaliação das Aprendizagens e Realização de Provas Finais no Ensino Básico”. No referido documento (que estranhamente nem foi tido em consideração pelo Governo nas tomadas de posição mais recentes, ainda que o mesmo tenha sido solicitado pela Comissão Parlamentar de Educação) pode ler-se claramente que “a proporção dos alunos que tendo obtido classificação interna positiva obtêm classificação negativa [pelos exames/provas finais] situa-se entre 0,3 e 1,9% do total.” e que “O contributo dos exames/provas finais do ensino básico para a retenção escolar não é relevante (…)”, o que consubstancia que cerca de 99% dos alunos portugueses se enquadra perfeitamente num sistema de ensino que, segundo os novos responsáveis governativos, “não é inclusivo”! Se isto não é demagogia, o que lhe chamar?
À parte de toda a manipulação demagógica e dos discursos popularuchos sobre a Psicologia Infantil, creio que o sistema implementado nesta última década e meia, não era nem “errado”, muito menos “nocivo”, como nos quer fazer crer o Ministério da Educação. Apresentava falhas (algumas severas) que careciam de melhorias mas, no essencial, era um bom modelo, e a prová-lo vários analistas trazem agora à discussão a evolução positiva dos resultados obtidos quer nos testes PISA, realizados internacionalmente, quer nos próprios exames nacionais.
Substituir uma prova que incide na classificação final do aluno, por uma outra que não tem qualquer peso na avaliação final do ciclo, representa um claro retrocesso de todo o sistema educativo. Caminhamos, outra vez, para a desresponsabilização dos principais agentes educativos em todo este processo. Dirigimo-nos, uma vez mais, para a indiferença perante um teste que será pouco mais do que de diagnóstico. Embora lhe reconheça virtudes e perceba as fundações em que assenta, embora até aplique a testagem de aferição/diagnóstico a meio do ciclo de ensino com que habitualmente trabalho, não é aceitável a sua utilização, em detrimento da avaliação facultada por uma Prova Final de Ciclo.
É consensual a obrigação de inculcar nos nossos alunos a responsabilização, o sentido de empenho, o combate ao facilitismo e, acima de tudo, o sentido do mérito e da recompensa advindos pelo esforço e pelo estudo. Só desta forma alcançaremos “a melhoria das aprendizagens e o sucesso escolar dos alunos”, que tanto ambicionamos!
Telmo R. Nunes
a 15 de janeiro de 2016


1 comentário:

José Eduardo Medeiros disse...

Palavra-chave: "desresponsabilização".
Excelente artigo de opinião! Parabéns!