Três anos
após a sua primeira edição, decidi ler o livro cujo nome empresta o título a
este texto, Memória das Minhas Putas
Tristes, escrito pelo Nobel da Literatura (1982), Gabriel García Márquez.
Tal como já tive oportunidade de o
reiterar aqui mesmo neste espaço, não sou grande apologista de Literatura
recomendada, dou mais-valia à descoberta por meios próprios e após a leitura e
posterior análise, efectuar a avaliação ao documento lido.
Muito menos aprecio quando o livro é de outrem e não meu, impossibilita-me o
seu livre e descuidado manuseamento, obriga-me a uma leitura com maior ou menor
prazo, já que há que devolver o que a outros pertence. Para além disso, vejo-me
sujeito a uma certa cautela, já que, uma página rota ou de outra forma violada,
significa o ter de prestar muitas explicações. Mais ainda, não há nestas
circunstâncias o desflorar das páginas virgens da recente compra, não há o
avolumar da resma dos que para trás ficaram lidos…
Ainda assim, e porque em torno deste,
circunstâncias muito especiais existiram, optei por contrariar o que tanto
prezo numa boa leitura e, não só me deixei levar por uma recomendação de uma
amiga e grande apreciadora literária, como também decidi ler a obra num livro
que não me pertence.
Apesar de tudo não me arrependo.
Devo dizer que desde há muito tempo
me suscitava interesse este título tão peculiar. Ora, advindo de um Nobel e
reconhecendo que para o ser há que escrever com uma enormíssima qualidade, foram
realmente três anos de namoro que agora findam com o desfolhar da última página
de tais “Memórias”.
«No ano dos meus noventa anos quis
oferecer a mim mesmo uma noite de amor louco com uma adolescente virgem (…)»,
assim se iniciam um conjunto de recordações fictícias (julgo) por parte de um
jornalista nonagenário boémio e agastado por uma vida levada aos píncaros no
campo sexual, repleta de emoções fortes, vividas nos diferentes bordeis das
cidades por onde circulava. Memórias de um bon
vivan, que nem aos noventa o quis deixar de ser…
Nesta obra Márquez consegue desnudar
o sentimento pelo qual todos passamos mais cedo ou mais tarde: o medo de
envelhecer, de nos tornarmos decrépitos aos olhos dos outros e às vistas do
mundo. É algo transversal ao ser mortal e gastável, muito embora muitos teimem
ainda negar tais pensamentos. Pura ilusão destes! Primeiro porque não enganam o
tempo e depois não ludibriam para sempre o próximo. Todos iremos passar por uma
situação assim, venha ela antes ou depois da real velhice. Ninguém está
preparado para ser ou sequer para parecer velho. Todos suspeitamos e queremos
acreditar que os adjectivos bom e velho só coexistem se do éter do Douro
estivermos a falar, daí ninguém querer parecer gasto mas todos anseiam
continuar bons, todos queremos crer sermos também “refinadas castas nos vales
luminosos plantadas”.
O “velho sábio” de Márquez
reconheceu isso mesmo a um dia de iniciar a sua nona década de existência,
outros senti-lo-ão mais cedo…
Não há forma de evitar o inevitável.
Por mais cuidados, cremes, intervenções que se paguem, o tempo não perdoa nem
sequer tem preço: é para esses, os que não sabem envelhecer, uma luta desigual,
perdida à nascença. Exteriormente podemos até enganar os desconhecidos, os
menos atentos, mas no íntimo não nos embustearmos nem a nós próprios sequer.
Resignemo-nos e aprendamos a viver as emoções que
cada idade nos quer oferecer, ou podemos simplesmente tentar ludibriarmo-nos e
tomarmos partido do patético, do ridículo, tentando, em vão, mostrar ao mundo que
somos diferentes, especiais e que o tempo por nós não ousa passar… Será essa a
ideia mor a transmitir nesta obra de García Márquez.
O livro é bom. Agradou-me em pleno a
forma como é escrito. O conteúdo, a história, a acção narrada não justifica três longos anos de namoro; um flirt,
talvez!
Ainda assim é dele, e ele é só um Nobel da Literatura.
Recomendo, pois!
Telmo R. Nunes
26/04/08
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