Como Torga
conseguiu engarrafar o sol que brilha sobre o “rio de oiro”, também Joel Neto
conseguiu aprisionar em, “A Vida no Campo”,
a essência da ilha, a essência de todo um arquipélago e de tudo isto a que,
comummente, designamos por ser ilhéu!
Tal como o
fizera em “Arquipélago”, o autor volta
a engalanar a ilha. Por ele, e valendo-se da sua escrita – aparentemente
simples e escorreita –, a Terceira torna-se ainda mais bela e apetecível:
«Viemos por quatro ou cinco anos e, agora,
quatro ou cinco anos não vão bastar.»
Cada entrada
deste diário surge-nos como um retrato pictórico altamente contagiante e
esteticamente belo, sem abdicar, jamais, de um realismo e veracidade ímpares,
do que será a vivência quotidiana no Lugar dos Dois Caminhos, na ilha Terceira:
«Se me
pedirem para reduzir ao essencial a diferença entre o campo e a cidade, então
aí está ela: o efeito que tem em nós uma sirene no horizonte. Na cidade, é
apenas mais uma sirene. Aqui, há uma boa hipótese de se tratar de alguém que
conhecemos, talvez até de alguém que estimamos.»
O seu ato discursivo, verdadeiramente
apaixonado e completamente comprometido com a ilha, não deixa de ser revelador
do longo êxodo a que o autor se viu sujeito. Dir-se-á que o seu regresso é aqui
amplamente festejado, mesmo sem o ser verdadeiramente:
«Mas comê-la [alcatra] na cozinha da infância, servida desta vez
não a um filho de visita mas a um filho regressado, foi como começar de novo.
Sabia-me a terramotos e a redenção.», ou ainda, «Tornei-me um turista em Lisboa e, de súbito, Lisboa ficou linda.»
Pela sua
capacidade insigne de mapear sentimentos, pela aptidão em transformar casuais
reencontros em quadros verdadeiramente afetivos, pela forma como o próprio
autor se oferece à ilha – aos seus costumes e tradições –, não será, pois, desacertado
afirmar-se que Joel Neto está indelevelmente ligado à sua própria ilha, e ainda
bem, arrisco!
Com as devidas
cautelas e distanciamentos que a geografia literária impõe, talvez os mais afoitos
possam agora afirmar que, com o livro em punho, sair-se da ilha não mais seja a
pior forma de nela ficar: poderemos agora levá-la connosco, transportá-la um
pouco mais próximo do coração, à distância de uma leitura fugaz, arrebatada e,
porque não, apaixonada!
Ao autor, os
meus parabéns!
Vale a pena ler autores açorianos!
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